Concessionárias de rodovias devem ser responsabilizadas por acidentes com atropelamento de fauna?

Concessionárias de rodovias devem ser responsabilizadas por acidentes com atropelamento de fauna?

Tempo de leitura: 7 minutos

Que motorista nunca se deparou com um animal, doméstico ou selvagem, nas rodovias brasileiras? Se não for seu caso, agradeça.

Estimativas do Centro Brasileiro de Ecologia de Estradas (CBEE), da Universidade Federal de Lavras, sugerem que entre 3 e 5 milhões de animais com mais de 3 kg são atropelados por ano nas rodovias brasileiras. Mesmo que animais de 3kg tenham menor possibilidade de dano direto, como amassar parachoques, causam riscos devido às reações dos motoristas.

O CBEE possui um formulário para diagnóstico destas ocorrências, você pode colaborar clicando aqui.

Alguns números

Acidentes com mortes ou danos graves às pessoas são bem documentados pelos boletins de ocorrência das polícias rodoviárias federal e estaduais.

Números oficiais de 2019 mostram que 1372 acidentes ocorreram devido atropelamento de animais nas rodovias federais. Destes, 81 tiveram vítimas fatais e 983 pessoas feridas. Entretanto, se aceitamos que há 3 a 5 milhões de atropelamentos de animais acima de 3kg todos os anos, devemos nos perguntar quantas ocorrências nunca são noticiadas. Certamente os danos destes acidentes são cobertos pelo proprietário do veículo.  Você pode ler mais sobre números e valores neste outro post, clique aqui.

A discussão sobre responsabilidades de atropelamento de fauna em estradas é ampla e controversa, certamente com vieses distintos quando falamos de rodovias sob concessão ou não.

O que diz a justiça?

No começo de 2020 a 2o Instância do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) confirmou que a concessionária BR 040 S/A deverá indenizar um condutor pelos danos causados em seu veículo, devido danos decorrentes do atropelamento de uma anta (Tapirus terrestris). O valor da indenização foi de R$ 12,9 mil.

A discussão obviamente foi pautada por divergências. Você pode ver alguns trechos do Acórdão que negou o recurso da concessionária.

“…, a ré, ora apelante, aduz, que não se configura a responsabilidade objetiva calçada na falha do dever de fiscalização, e que o dono do animal é o responsável pelo evento danoso. Afirma que adota todas as cautelas em relação aos serviços prestados na rodovia e que a pista é inspecionada 24 horas por dia, ressaltando a imprevisibilidade e inevitabilidade do acontecimento atípico. Que não houve nexo de causalidade entre o dano e a conduta da apelante, pugnando pela improcedência da condenação pelos motivos acima expostos.”.

“A princípio, cabe ressaltar que o caso em questão será analisado à luz do Código de Defesa do Consumidor, o qual adere à teoria da responsabilidade objetiva, a qual dispensa a comprovação da culpa do agente em relação ao ato danoso para caracterizar o dever de indenizar, bastando, então, a ocorrência do dano e o nexo de causalidade. Sobre a aplicabilidade do CDC em casos análogos, já decidiu o colendo Superior Tribunal de Justiça:

“CONCESSIONÁRIA DE RODOVIA – ACIDENTE COM VEÍCULO EM RAZÃO DE ANIMAL MORTO NA PISTA – RELAÇÃO DE CONSUMO. As concessionárias de serviços rodoviários, nas suas relações com os usuários da estrada, estão subordinadas ao Código de Defesa do Consumidor, pela própria natureza do serviço. No caso, a concessão é, exatamente, para que seja a concessionária responsável pela manutenção da rodovia, assim, por exemplo, manter a pista sem a presença de animais mortos na estrada, zelando, portanto, para que os usuários trafeguem em tranquilidade e segurança. Entre o usuário da rodovia e a concessionária, há mesmo uma relação de consumo, com o que é de ser aplicado o art. 101 do Código de Defesa do Consumidor”. (RESP 467 883 – RJ/Relator: Ministro CARLOS ALBERTO DIREITO).”.

” Nesse sentido, para reconhecer o dever de indenizar, é suficiente a demonstração do dano e do nexo de causalidade, cabendo à concessionária do serviço público comprovar a ocorrência de uma das causas excludentes da responsabilidade.

No presente caso, não há dúvidas de que o acidente ocorreu por causa da presença de animal (anta) na rodovia sob a concessão da apelante, sendo possível constatar que o dano e o nexo causal restaram devidamente demonstrados conforme prova de fls. 1415 (boletim de ocorrência da polícia rodoviária federal) e declaração de atendimento, fls. 16.”.

Este caso não é inédito. Decisões semelhantes já foram obtidas em datas anteriores (ver TJMG – Apelação Cível 1.0223.15.004162-0/001, 15ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 27/06/2019, publicação da súmula em 05/07/2019).

Você não precisa grande esforço para encontrar um abundante material que envolva o tripé Animais x Concessionárias X Acidentes. A matéria abaixo é uma das dezenas que demonstram que os problemas não são pontuais, mas corriqueiros e ocorrem em todas as concessionárias.

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